A DRAMÁTICA HISTÓRIA DO GARFO

Radioclip en texto sin audio grabado.

O garfo nasceu em Florença. A Igreja condenou seu uso. Sabe por quê?

NARRADOR Durante séculos, as pessoas comeram com as mãos. Na mesa ou no chão, compartilhavam jarras, bandejas e copos. As facas eram usadas para cortar a carne. As colheres também eram empregadas para tomar sopas e molhos. Mas para os alimentos sólidos, todo mundo metia a mão no prato.

MULHER (SOFISTICADA) Que os plebeus metam a mão. Nós, nobres, tocaremos os manjares somente com três dedos… Assim!

NARRADOR E assim foi. A partir dos tempos romanos, as pessoas de boa criação não sujavam nunca o dedo anular nem o mindinho.

CONTROLESICA DE ÉPOCA

NARRADORA Em Florença, lá pelo século 11, apareceu o garfo. O clero, imediatamente, condenou seu uso:

PADRE Só os dedos humanos, criados por Deus, são dignos de tocar os alimentos que também nos dá o Senhor.

HOMEM (SOTAQUE ITALIANO) Deixe-me explicar, senhor padre. Está vendo esta colher? A colher é como uma “estensione” de nossa boca. E a faca? Uma “estensione” de nossos dentes. Pois bem, o garfo é… uma “estensione” de nossa mão, dos dedos.

PADRE Chega de bobagem. Os filhos de Deus não precisam de nenhum garfo.

NARRADORA E o garfo continuou proibido. Durante mais cem anos, este utensílio se manteve como uma novidade escandalosa. Em Veneza, em um banquete, uma mulher nobre comeu com um garfo fabricado segundo seu próprio desenho. Atraiu a ira dos clérigos presentes. A mulher morreu poucos dias depois, provavelmente por causa de uma epidemia reinante na cidade. Mas os clérigos difundiram outra versão:

PADRE Castigo divino por seu excessivo refinamento ao comer!

NARRADORA No século 16, o garfo ainda não era mais que uma curiosidade italiana, decorativa y custosa. Os homens que o usavam eram apelidados de afeminados.

NARRADOR Os garfos se mantinham como algo tão estanho que um popular manual de etiqueta julgou necessário dar este conselho: “Não tente comer a sopa com um garfo”.

NARRADORA Somente no século 18 o uso do garfo se generalizou na Europa. A nobreza francesa, em seu afã de distinguir-se dos revolucionários que pregavam a igualdade de classe, incrementou seu uso.

NARRADOR O garfo converteu-se, desde então, em símbolo de luxo e categoria. Até os padres começaram a usá-lo e defendê-lo. O garfo, antes excomungado, agora estava permitido. E o que era proibido agora era tocar a comida, mesmo que fosse com três dedos. 

BIBLIOGRAFÍA
Charles Panati, Las cosas nuestras de cada día, Círculo de Lectores, Barcelona, 1990.