O QUE ESTÁ ACONTECENDO COM EVO MORALES?

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As contradições do atual presidente da Bolívia…

Em repetidas ocasiões, os RADIALISTAS têm felicitado e colocado sua esperança no governo boliviano conduzido pelo líder indígena Evo Morales. Hoje, não podemos calar nosso desconcerto e repúdio frente à repressão policial contra a marcha pacífica da população do Parque Nacional Isiboro Súcure, TIPNIS, em defesa de seu território.

Enquanto escrevemos, ficamos sabendo da renúncia da ministra de Defesa, Cecilia Chacón, em protesto pela bárbara atuação da polícia a poucos quilômetros da população de Yucumo, departamento de Beni, onde dezenas de indígenas foram espancados e levados contra sua vontade de ônibus com rumo desconhecido. Também renunciou o ministro de Governo, Sacha Llorenti, responsável pela repressão.

Evo Morales ordenou deter a construção da estrada que atravessaria a reserva natural e tem deslindado responsabilidades com a atuação da polícia. Mas isto não tem acalmado os indígenas nem a vários setores sociais, inclusive a COB, que tem saído para protestar nas ruas.

O que está acontecendo com Evo Morales? Um indígena contra seus irmãos e irmãs indígenas? O maior defensor da Mãe Terra pactuando com as transnacionais a construção de uma estrada que afetará gravemente uma reserva natural, a selva amazônica e seus rios? Para dimensionar estas contradições, compartilhamos com vocês este editorial radiofônico do colega e companheiro Andrés Gómez Vela, Secretário Executivo da ERBOL, recebido ontem de La Paz.

Equipe RADIALISTAS

CARTA AOS POVOS INDÍGENAS

“A Cada dia desaparece no mundo uma extensão de florestas e selva equivalente a 36.000 campos de futebol. A cada ano se perdem 13 milhões de hectares de florestas e selva. A este ritmo, as florestas desaparecerão antes do fim do Século”.

Sabe quem disse estas palavras tão reais? Não imagina? Já sabe, mas não quer dizer seu nome?

“As florestas e a selva são a maior fonte de biodiversidade. Se continuar o desmatamento, milhões de espécies animais e vegetais se perderão para sempre. Mais de três quartos da água doce acessível vieram de zonas de captação nas florestas, dai que a qualidade da água piora quando a condição da floresta se deteriora”.

Já adivinhou ou deduziu quem é?

“As florestas e a selva são os pulmões da atmosfera. 18% de todas as emissões

de gases de efeito estufa que se produzem no mundo são provocados pelo

desmatamento. É fundamental deter esta destruição de nossa Mãe Terra”.

Bom, agora sim já sabe quem disse estas formosas e verídicas palavras, não é? Sim, acertou. É Evo Morales, o presidente da ex República da Bolívia.

Não só disse isso, e algo mais, pediu “pleno cumprimento dos direitos dos povos

indígenas estabelecidos na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos

Povos Indígenas, o Convenção 169 da OIT e outros instrumentos internacionais; reconhecimento e respeito a seus territórios; revalorização e aplicação dos conhecimentos indígenas para a preservação das florestas; participação e gestão das florestas e da selva pelos povos indígenas”.

Estas palavras estão em uma carta enviada em 29 de setembro de 2010 aos povos indígenas do mundo, entre eles os povos que vivem no Território Indígena do Parque Nacional Isibore Sécure (TIPNIS), a quem seus funcionários chamam hoje de traidores e fantoches da direita por ter recebido esta carta e acreditado no que lhes dizia o (ex) defensor da Mãe Terra.

Desde aquela data até este dia passou um ano e se produziu um giro de 180 graus: a carta escrita com a (mão) direita foi apagada com o cotovelo (esquerdo) e colocou em xeque o denominado Estado Plurinacional porque sobrepõe uma só nação (cocaleira)

sobre três menores: Yuracaré, Tsiman, Mojeño.

Assim crua parece a vida. As vítimas de ontem (bases de Evo) dos conquistadores

europeus são hoje os espanhóis de 1492 que querem civilizar os indígenas que se

negam a aceitar o desenvolvimento ocidental do cimento. Ainda pior, cometem as mesmas ações que condenaram quando Pizarro mandou “namorar” suas mulheres para superar a resistência nos inóspitos terrenos dos sentimentos mutilados e violados pelo poderoso invasor.

Ficou demonstrado que o papel aguenta tudo, mas a natureza não. Também ficou

demonstrado que o papel não resistirá a um desastre ecológico se o autor daquela carta

contribui no desaparecimento de uma extensão de florestas e selva equivalente a 10 mil

campos de futebol (ou pensará em presentear depois grama e árvores sintéticas aos invasores do Tipnis?).

É provável que a história não julgue, mas a Pachamama sim e é implacável com seus filhos que dizem que a defendem quando na realidade se convertem em corresponsáveis pelo desaparecimento de 13 milhões de hectares de florestas e selva a cada dia.

“Neste ritmo, as florestas desaparecerão antes do final do Século”, escreveu Morales

Presidente. No ritmo de Morales cocaleiro, desaparecerão muito antes de meados do século, pelo menos em uma parte do território boliviano.

É certo que em um corpo haja muitos seres (como diria Herman Hesse), mas pode

haber tanta contradição em um mesmo ser e em tão pouco tempo? Ou não teria escrito ele aquela missiva que exige o pleno cumprimento da Convenção 169 que estabelece o direito à consulta aos povos indígenas e o direito a decidir seu próprio desenvolvimento de acordo com seus usos e costumes?

Andrés Gómez Vela

CONVIDAMOS AOS RADIALISTAS E AS RADIALISTAS DA TÃO QUERIDA BOLÍVIA A QUE NOS CONTEM E EXPLIQUEM O QUE ESTÁ ACONTECENDO.  TODAS AS OPINIÕES SERÃO PUBLICADAS.  

NOTA
O próprio Andrés Gómez, em um editorial anterior, refletia assim: “Mas, nem tudo está perdido, o processo está a tempo de ser salvo sempre e quando o Presidente escute outras vozes das que habitualmente ouve. É momento de uma reunião com todos os atores sociais, políticos e econômicos. O processo pede uma mudança antes que ressurja a direita… e mude de processo.”